05/04/2010

Roxanne

- Talvez, um pouco mais de paixão... É isso, mais paixão! - A professora ecoava do canto do salão envolta no perfume do cigarro aceso.
1, 2, 3... A mão que não se encontra com a outra, o olhar perdido, passo desencontrado da música. O que deveria ser um caso de ódio-amor-assassinato-drama então poderia ser brincadeira de criança. E ela gritava:
- Raiva! Você está com raiva! E amor! Você está confusa, você o viu com outra, seu amor despedaçado, seus sonhos no chão! O que há com vocês dois? - Ela esbravejava impaciente.
Uma, duas, três, dez vezes. E ele, que a segurava com cuidado contido, com postura insegura demais... Não, errado, errado! Ela, que o olhava com seriedade, seu rosto vazio, contando os passos. Tango não é isso!
Pegou a aluna pelo braço, deixou-a de lado. Pegou o par e lhe mostrou como deveria fazer. Raiva, desconfiança, acusação! E ciúmes, sim, ciúmes... E loucura! Força, descontrole, olhos semicerrados entre lágrimas de desgosto e ódio... Como ele pôde?
4, 5, 6... E a música que levava seus sentimentos talvez para algum lugar longe dali... Diretamente para aquele estado de torpor. E ele a acusaria, e ela veria os olhos dele crivados de culpa... E o perfume de alguma outra, vagabunda, em sua roupa. Um tapa no rosto, com força, com motivo, carregado com o desprezo de uma mulher enganada, pelo preço que toda a mulher paga mais cedo ou mais tarde pelo simples fato de nascer mulher. Por ser essa mulher assim, forte como um temporal, louca e destrutiva, assim, filha de uma natureza que sempre cobra seu preço. E ele, coeso, seguro, com todo seu corpo esbravejando a culpa dela, fluindo sua natureza masculina, cheia de razão, cheia de desprezo pela fraqueza dela. A pega pelo pulso, e ela sofre. Tenta se soltar, se esquece de que é muito menor, apenas uma mulher, afinal. E ela cai no chão, com força, se arrasta enquanto ele a olha de cima, do alto de seu orgulho. E ela grita.

E a música pára, talvez por tempo demais.


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