28/12/2007

Vermelho

Acenda as velas do seu quarto, reze aos seus deuses pela sua alma perdida e pela minha que se perdeu. Quantas vezes eu te disse o tamanho do meu doce amor?
Saia pela rua, devastada por tudo de ruim que há em nós, e ande por aí, perdida.
Sinta a maresia da manhã, o orvalho que a tudo purifica, o ronronar do mar distante. Olhe através do horizonte, até onde enxerga?

Dos olhos além de mim, há apenas um vento litorâneo, suave e sempre presente. Em mim e em tantos outros, sempre o mesmo gosto, o mesmo sabor, a mesma alma. Festejaram por mim e dançaram por mim, e o que restou agora? Apenas uma outra alma enjoada do balanço do mar.
Histórias. Sorrisos. Há sim, alguém tão perfeita.
E amanhã, depois que a chuva e a neve passarem, vou à caça. À caça de uma nova sensação, de uma nova manhã, de um novo oceano, com um novo sabor, com um novo mistério.
E através da escuridão dos lugares sombrios da cidade, veja-me. Eu sou aquela que passa despercebida na multidão. Aquela, a de máscara, aquela que mente. "Você ainda me ama? Você um dia me amou?"

Eu sou aquela que tem sua alma do avesso, aquela que sente dor em saber que as borboletas do outro lado do mundo morrem quando batemos palmas.

Hoje, quando for dormir, pense em mim. Eu não sou uma criança. Eu não sou ingênua. Você não é tudo isso, nem eu. Eu não sou divertida, eu não sou racional, você não é perfeita, e eu sinto muito, muito medo disso tudo.
Pequenas verdade, que ultrapassam qualquer mentira que eu disser ou pensar em dizer.

Essa noite, tranque as portas, feche as janelas, esconda as chaves. Acenda o que de ti há em todas e em mim também. Durma suave ao meu lado. O dia da caçada está perto.




"Dos fantasmas dos meus sonhos,
você é o último que dá adeus."


























Que cor você está vendo agora?

21/12/2007

Fantasma


Sem dizer nada ela me olhou. Bem fundo, ela não só olhou, ela viu. Ela me percebeu, lá no meio daquela gente toda, vestida de cinza, eu tão apagada na multidão. Eu vi ela balbuciar alguma coisa naquele mar de gente, mas não entendi sequer uma palavra. Ela me chamou a atenção, a única que andava de cabeça eguida com ar de serenidade no meio de toda aquela gente. Todos com muita pressa, cheios de sacolas, carregando um falso espírito natalino comprado a preço de liquidação, correndo como ratos no esgoto.

Se eu esticasse o braço poderia tocar seu rosto. Neve, branca de neve. Perfume de rosas. Olhos crepitantes e velhos, olhos velhos.

Alguém bateu seu ombro no meu e eu a perdi de vista. Uma moça tão linda, de ar tão vazio... Vôou no pôr-do-sol e perdeu-se na imensidão?



E eu fiquei lá, cinza.
Fantasma.