02/04/2017

Deu-se conta

de que relacionamentos pareciam muito com a bolha de ar na qual sempre procurou se refugiar. Uma cura. A saliva do cão que lambe as feridas. A idealização do silêncio que precede o amanhecer.
Deu-se conta de que a plenitude do silêncio parecia obstinadamente estar dentro da batida de um coração próximo ao ouvido, na temperatura morna de alguém respirando assim perto, recostada na curva do seu braço esquerdo.
Deu-se conta do desespero que cerca tudo isso, da antecipação de que um barulho ensurdecedor pare de enlouquecê-la, da ansiedade constante que é querer pertencer.
Deu-se conta de que todas tentavam fugir de alguma forma, de que todas tentavam curar-se, de que todas procuravam acalentar suas angústias, de que todas procuravam restaurar suas partes em alguma unidade perdida, como se nos abraços alheios (das outras) repousasse a última instância de todas as respostas.

Deu-se conta de que ela não era diferente.
Deu-se conta de que também procurava uma cura.

Mas também deu-se conta de que estava irremediavelmente sozinha.