18/01/2008

Te presenteio com o que há de melhor e pior em mim, me transfiguro primeiro em verde, depois em púrpura e então em vermelho. No final das contas, embaixo da capa negra, nada mais há do que o cinza. Aquele cinza dos dias nublados, aquele cinza dos dias chatos.
Tudo o que eu quero ser, ri de mim quando me olho no espelho e o que eu vejo no espelho nada mais é do que todos os lábios do mundo virados pra cima em um sorriso de escárnio. Chuto a sua cara, escrevo coisas desimportantes e incoerentes, tiro sempre as mesmas fotos, falo sempre as mesmas coisas, tenho sempre as mesmas esperanças.
Se eu abro a porta da casa e cato os gatos da rua, você se importa? Se os coloco todos em cima da minha cama e durmo no chão, você se importa?
Se eu amo desorientadamente e as pessoas me fazem pensar sobre o que realmente eu quero (ou não), ou sobre as certezas que eu tenho (ou não) e que parte de mim não passou do papel ou não saiu de uma realidade que eu senti e só, eu me importo?
Se todas as respostas do universo se deparassem com todas as minhas perguntas, eu viraria as costas e iria embora. Eu não quero mais resposta nenhuma.
Eu não sou um pseudo-ídolo maldito vindo do inferno. Eu nunca disse que seria fácil, eu nunca tive certeza de nada. Eu não sei andar sobre um terreno de pedras escorregadias. Eu não sou estável. Eu não nasci pra ser uma boneca. Eu nasci pra ser ninguém em meio a outros ninguéns tão insignificantes quanto eu.
Desabafo sobre um monte de merda, tiro as conclusões e pareço que nunca vou crescer. Tenho medo de pessoas mais velhas do que eu. Tenho medo de pessoas da minha idade. Eu quero parar no tempo.





Eu não quero mais parecer uma barbie idiota e decadente.
"Ela sempre foi tudo o que eu quis ser um dia.
E talvez, eu ainda queira."

14/01/2008

Azul Profundo


Ele me levou até a praia, onde de longe eu já sentia o cheiro do sal. Eu não entendia como algo podia fazer um barulho tão alto e que podia ser ouvido de tão longe.

- Falta muito vô?

- Não minha filha, a gente tá perto.

Quando colocamos os pés na areia morna e branca da praia, imediatamente eu quis tirar os chinelos. Deixei de lado minhas pequenas sandálias cor-de-rosa e tentei divisar aquele gigante à minha frente. Meu avô olhava o horizonte, orgulhoso do presente que me dera.

- Esse é o mar. O mar tem vida própria, espaço próprio, música própria. Ele não têm limites, ele gosta de brincar de ser infinito. Eu vivi minha vida toda me servindo dele, ele me foi generoso. Agora que o meu fim está próximo, esse é meu presente pra ti. Ele necessita respeito. É um patrão temperamental.

Eu, do alto dos meus seis anos, mal acreditava no que estava vendo. Aquele monstro azulado, rugindo pra mim, andando de um lado para o outro como um tigre na jaula, por vezes vinha molhar meus pés, alisando minha pele. De uma ferocidade tão grande, como era possível dobrar-se à um humano, dando-lhe o sustento de uma vida inteira, sem nunca cansar-se disso?

- O mar, minha filha, gosta de ser temido. O mar não é amigo de quem não tem medo dele. As águas que você vê aqui, são as mesmas que já estavam aqui quando eu tinha a sua idade, e quando o avô do meu avô era criança. O mar é velho. Um velho esperto e que sabe recompensar quem o agrada. O mar cobra seu preço.

- Mas vô... Pra onde vai toda essa àgua?

Ele fez uma pausa, se agachou do meu lado, me beijou o rosto e sorriu.

- Eu não sei minha filha, eu não sei. Talvez desemboque em um mar ainda maior, ainda mais feroz e gelado, talvez em uma pequena lagoa salgada, talvez do outro lado do mundo, onde as águas são inférteis. Quando você for mais velha, promete que descobre pra onde ele vai?

Eu acenei positivamente com a cabeça. Quase me imaginei vestida de pirata.

Meu avô me levou de volta pra casa, me enchendo de histórias da sua juventude. Me contou sobre as tempestades que enfrentou sozinho à bordo do Corcel Negro, seu barco mais fiel. Me contou dos peixes gigantes, das sereias.

No fim do dia, preparou um jantar e me pôs pra dormir. Das frestas da persiana eu o vi sair em direção à praia, resignado.




Naquela noite, o mar cobrou seu preço.
Naquela noite, as sereias cantaram mais alto.

03/01/2008

Viagem ao Novo Mundo (Perfume de Oceano)

Eu páro na escada, hesitante, deço sem fazer barulho.
Você me vê?
Disse que me observa faz tempo, como eu pude te deixar distante dos meus olhos tão dispersos?
Você nem me olha, distante nos assuntos ao ouvido. Doce oriental, modernidades à parte, vestida de vermelho, sempre gosta dos de alma azul.

Eu vi o nascer do sol ao seu lado, tão desconhecida, tão marcante. Eu consigo não parecer ingênua ao seus pés, libriana?
Vinda de um acaso tão chocante, tão brilhante, tão passageiro. Piscou forte na minha janela empoeirada, me cegou e foi embora tão rápido quanto apareceu. Eu sei o nome do jardim onde você mora, minha pequena flor selvagem? Eu sei seu nome?

Uma criança como eu.
Um destino como o meu.
Tudo o que eu sei... Peter Pam.