14/07/2020

Moonlight




Aqui os devotos entram e saem. Silenciosos acendem velas e entre suspiros fazem preces indecifráveis. Levam daqui sempre algo, um pedaço de mim, pequeno a ponto de esconder-se no subconsciente ou grande demais para caber na alma.
Eu observo seus passos silenciosos e nem sempre respeitosos pelo chão de terra. Passam as mãos pelas paredes, sentam-se no chão, ouvem os ecos nas estruturas de pedra antiga.
Ás vezes eu presencio pequenos milagres, como a maçã verde que amanheceu mordida no altar sem que ninguém a tivesse tocado. O cheiro de mel, madeira e canela no ar. Os pássaros que fizeram ninho aos pés gastos da imagem de seio desnudo no centro da caverna.

Mas vem aqui alguém incansável. Jejua e faz preces incansáveis. Dá voltas na imagem com seus pés descalços e olhos pontiagudos, incansável.

Penso que não teve suas preces atendidas, ou que deve ter muito o que agradecer. Penso que deve haver algo aqui que o fascina ou que o cega, como um começo sem fim. Começos sem fim sempre pesam nos ombros dos homens.
Penso que há algo de excitante em sua busca, como lembrar-se sempre do que havia de bom em algo, como apagar os defeitos, como lembrar-se de como é flertar com o desconhecido. Buscas pelo flerte com o desconhecido sempre pesam nos ombros dos homens.
Penso que aqui parece um lugar seguro para suas preces. Uma caverna como essa parece exigir paciência e olhos treinados para ser totalmente descoberta. Sorrio de maneira infantil com a revelação. Uma parte de mim acha engraçado que um lugar como esse possa servir para qualquer coisa que não seja um celeiro de ego, utopia e caos. Mas outra parte de mim entende.

do lado de fora ouço vento de uma tempestade que se aproxima
um lobo uiva para o que ainda se vê da lua
me arrepio unindo a pele dos pés à nuca, arrebatada

My one, when all is said and done
You'll believe God is a woman

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