19/10/2017

Simile

Há algo à soleira da porta. Algo obscuro, sem nome. Sem nome porque apesar de me parecer familiar, me é desconhecido.
Não há nada depois da esquina, veja bem. Não há mais animais à espreita nesse deserto, tampouco criatura tentando qualquer coisa perto da dilaceração iminente da minha carne. Na verdade o que há em mim não parece esperar, já está aqui, presente e constante. Um peso, uma coisa perto de qualquer comichão no fundo da minha cabeça, uma dormência contínua, ruído branco pronto pra ser só isso, gota d'água pingando num eco pra marcar o tempo em ritmo infinito.

Mas me cansa. Como me cansa. Esse parasita agarra-se às minhas entranhas, penetra meus ossos, força sua passagem entre as minhas respirações. Dobra meu corpo devagar, invariavelmente sem pressa. Pendura-se insolente nos meus joelhos, segura firme meus tornozelos. Aumenta a gravidade de maneira tenaz e persistente, apunhala minha nuca, aprisiona meus músculos.

O que me parece com tudo isso, é que saio de uma caixa para entrar em outra. Desfaço um nó para que outro seja feito. Saio do labirinto para outro maior ainda. Acho uma resposta e junto à ela, outras milhares de novas perguntas.

Se mordo meu próprio rabo, se afundo a terra sob meus pés ao andar nesses círculos, há algo que me diga que a vida não é prisão?



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