04/12/2015

Viver é uma experiência solitária

Mais uma vez me dou conta de verdades absolutas que me fazem enxergar o mundo de uma forma terrivelmente racional. Terrivelmente, digo, porque dói. E dói com força, como um punho que sobe do meu estômago rasgando minhas vísceras em direção às minhas costelas, assim, vindo de dentro mesmo, num movimento pra agarrar devagar minha garganta. O medo me vem como uma reação automática ao desconhecido, como algo que supostamente foi criado pra me convencer e não ir em frente, pra evitar que eu me machuque. O medo quer que eu sobreviva. Mas eu vejo.
Talvez eu tenha alcançado aquele nível de enxergar as coisas que são muito humanas, que me colocam numa posição de extremo respeito pelas coisas que eu sinto, mas que me isolam numa posição de intenso desprezo pelos movimentos naturais.
Viver está sendo uma experiência cada vez mais solitária. Viver é exílio.
Não há nada sem fórmula e é com esperável resignação que descubro que a vida e o amor, e a paixão e as sensações de liberdade ou auto-conhecimento chegam a mim como jorros químicos, queimando células e me deixando intoxicadamente eufórica ou consciente de tudo o que se passa em mim (e nos outros). Porque é isso que é: sentir cada célula, cada poro, cada lágrima brotando devagar subindo pela garganta, provocando um rubor incontrolado no meu rosto, embaçando minha visão, caindo pra fora do meus olhos sempre rápido demais, quase frio em contraste com o sangue fluido que colore minha pele. Mais do que sentir, eu vejo.
Tudo parece mais lento que o natural, porque o tempo é relativo daqui de dentro e tudo funciona em um infinito processo. Porque em mim e nos outros, tudo parece encadeamento: parte de uma grande máquina biológica provocando reações embriagantes e sinistras. Porque em algum momento da evolução do mundo, duas moléculas se uniram pra determinar a primeira e única regra válida: sobrevivência a todo o custo. Imortalidade. Persistência.
E tudo parece só isso: produzir pra existir. Produzir pra sobreviver. Conservar-se, manter-se, prosseguir até que em última instância as reações químicas te digam pra parar. Te gritem pra desistir. Te implorem pra aceitar que não há mais saída. Até o final, parece ser necessário persistir porque a desistência não é natural da espécie humana: é doença. Desistir é digno de pena. Desistir é digno de investigação, de terapia, de compostos químicos sintéticos contra reações humanas não humanas.
Enxergar isso de forma tão clara só me leva ao extremo oposto da evolução: não há nada que eu não racionalize e que me leve a querer sobreviver num mundo feito de reações químicas construídas com o intuito de me fazer sentir inútil se minhas células de alguma forma não se reproduzirem. Inútil se e de alguma forma eu não deixar nada, NADA, no mundo que seja meu e único, mas que seja notável e queira também sobreviver de alguma forma: uma árvore, um livro, um filho.
E eu também enxergo os outros infinitamente como parte da teia, mesmo com os olhos fechados, porque minha mente tem olhos sem pálpebras. Eu vejo. E tudo em todos ainda é processo. Mas em mim, um processo permanente de "só existe essa conformidade que se alastra, que não é quente e não é fria, que segura com firmeza a minha garganta, mas não aperta. Que me sufoca, mas ainda assim me deixa respirar (um bocado e mais um bocado e mais um bocado).


Só o suficiente pra que eu sobreviva. Eu sobrevivo, mas não sou uma sobrevivente.
Eu nem luto.
eu nem..."


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