01/11/2009

SerHumano


Eu e ela, manhã de um sábado qualquer nas ruas de Porto Alegre, paramos para descansar antes de continuarmos a andar sem rumo.
- Acho que isso é mais do que simplesmente um hábito. Acho que é um exercício social. Faz com que a gente se sinta bem. Faz com que algo no nosso estômago reviva aquelas borboletas, sabe quais?
- Sei. As borboletas. Tá.
- Então. Não vejo nada de errado em flertar. Acho saudável.
Talvez eu acreditasse nas palavras dela. Daqueles olhos negros saiam o olhar mais letal que eu já tinha visto. Morri algumas vezes quando eles conseguiam me acertar de cheio sem querer. Ainda não sei se gosto de estar ao lado dela quando ela ativa aquilo, seja lá o que se chama. Era como se algumas cordas amarrassem de leve meus tornozelos e braços, passando por meus dedos e roçassem minha nuca de leve, morno. E então iam apertando, apertando... Até que eu me esquecia de respirar. Uma tontura doce envolvia minha cabeça e eu saia de mim por alguns instantes.
Intimamente eu gostava daquilo. Prender-me por uns instantes nos olhos ônix dela enquanto ela errava o olhar e ele ia parar em mim; Eu podia sentir o gosto forte da pele dela se me demorasse o suficiente.
- Acha mesmo que isso funciona? Quero dizer, lançar toda essa carga sexual encima das pessoas. Isso não é perigoso?
Ela mexia constantemente nos cabelos e passava a mão no pescoço nu. Eu via a pele transparente dela latejar. Tomava um suco de morango artificialmente colorido e perfumado.
- Não, acho que não. Eu não sei se faço de propósito. Eu só sou eu. Claro, é como aquela sensação que todo mundo busca, de estar vivo. As pessoas tem formas diferentes de lidar com o que aparecem. - Ela tomou um longo gole com os lábios rosados na beira do copo. E então lambeu os lábios me atravessando com um longo olhar profundo. E então foi como se eu estivesse nua e um arrepio transcorreu de leve a minha espinha. Minha primeira reação foi querer sair correndo. depois, foi como se eu estivesse caindo, as minhas entranhas correndo desesperadas dentro de mim. Mas então eu voltei pro chão. Foi como se eu estivesse sem órgãos por um instante. Minhas mãos formigaram, e eu pisquei devagar meio fora de mim.
- Por que você está me olhando desse jeito? - Ela me perguntou sustentando o olhar.
Eu percebi então. Toda aquela névoa e aura de mistério tinham sido pra mim.
-Eu? Nada. Não é nada não.

Claro, apenas mais um exercicio social. Eu podia me acostumar com aquilo.

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