(...)"Naquela noite me arrumei com cuidado, fiquei sabendo que ele não gostava de mulheres vulgares, que gostava de mulheres sofisticadas, contidas e educadas. Sabia que ele gostava de bancar o dominador, e que tinha talvez uma queda por mulheres mais novas.
Ao chegar ao local combinado, entrei na ante-sala ampla e as portas altas à frente estavam fechadas. Ouvia apenas uma melodia calma vindo de lá dentro, e a respiração acelerada daquele desconhecido me esperando. Avancei no que pareciam ser os passos mais difíceis da minha vida, ouvindo o eco de cada centímetro caminhado no mármore do chão. Pensei que a luz talvez poderia tornar tudo mais fácil, uma luz morna e amarelada, vinda indiretamente de abajures e cachepots espalhados nas paredes e pequenas mesas, mas ainda sentia meu rosto queimar como de uma garota. Toquei a maçaneta devagar e respirei fundo. Apertei-a junto às minhas luvas brancas ouvindo o roçar suave do couro com o metal.
Mas talvez algo tenha disparado na minha mente, uma vergonha, talvez medo. Eu que já tinha feito aquilo tantas vezes me julguei assustada, insegura e patética, uma caricatura de um comportamento humano que sentia desprezar. Pensei muitas vezes, talvez por um segundo, talvez por dez, talvez por uma hora.
Ao chegar ao local combinado, entrei na ante-sala ampla e as portas altas à frente estavam fechadas. Ouvia apenas uma melodia calma vindo de lá dentro, e a respiração acelerada daquele desconhecido me esperando. Avancei no que pareciam ser os passos mais difíceis da minha vida, ouvindo o eco de cada centímetro caminhado no mármore do chão. Pensei que a luz talvez poderia tornar tudo mais fácil, uma luz morna e amarelada, vinda indiretamente de abajures e cachepots espalhados nas paredes e pequenas mesas, mas ainda sentia meu rosto queimar como de uma garota. Toquei a maçaneta devagar e respirei fundo. Apertei-a junto às minhas luvas brancas ouvindo o roçar suave do couro com o metal.
Mas talvez algo tenha disparado na minha mente, uma vergonha, talvez medo. Eu que já tinha feito aquilo tantas vezes me julguei assustada, insegura e patética, uma caricatura de um comportamento humano que sentia desprezar. Pensei muitas vezes, talvez por um segundo, talvez por dez, talvez por uma hora.
Então, em um determinado momento repentino tive a revelação de que meu corpo era só meu e que eu poderia fazer o que quisesse com ele, vi que a vontade de usá-lo era minha também e no fundo apreciava o que ele poderia me proporcionar. E que eu poderia proporcionar esse prazer íntimo de desapego não só à outras pessoas, mas a mim mesma. Que isso no fundo não me fazia pior ou melhor pessoa, não me fazia ser má ou boa, mas me fazia humana, simples e instintiva, sendo caça e caçadora.
Entrei no quarto aparentando timidez e fechei a porta atrás de mim com o máximo de delicadeza que consegui. Ele me esperava aparentemente ansioso sentado na cama, e me fez um gracejo que ignorei sumariamente antes de me iniciar naquele teatro que fazia com tanta naturalidade.(...)"
{***}
"É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo."
C. Lispector
"É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo".
ResponderExcluirSegredos que todos temos! Alguns guardamos, outros deixamos no ar, outros apenas nos enganam.
E a vida continua, sempre da mesma forma que é, esperando que façamos algo para deixá-la diferente. Mas mudar pra que? Bom... de fato é o que vivemos, mudanças.
Bjss e obrigado pela visita....
Entendo bem ela, mas ainda não consigo ter a mesma consciência e acho que nunca deixarei de enrubescer.
ResponderExcluirFechar o texto com essa passagem da Lispector foi majestoso, parabéns!